sábado, 11 de agosto de 2007

Amor/doce abismo do universo abstrato

Olhei fundo para os olhos daquela mulher,...
e, mesmo na penumbra daquele buraco de humanidades,...
Consegui enxergar seus tristes olhos da noite,...

Disfarcei porque não queria constrangê-la,...
A inclinação de seu rosto também procurava disfarçar tal sentimento,...
Ambos sabíamos o quanto é perigoso revelar nossas fraquezas,...
Ah, e como somos fracos,...

Continuamos aquele teatro justamente para esquecer,...
E, procuramos nos distrair nos provocando,...
Sussurrava nos meus ouvidos seus segredos sujos de infância,...
Afinal, acabei revelando os meus,...
mas nem a vergonha estampada na minha cara,...
foi capaz de deter minha vontade de possuí-la,...
pura e simplesmente,...
como um capricho de criança,...
como um doce de criança,...

Tudo isso ela já sabia, apenas fazia tempo para adiar o encontro,...
E, continuava sussurrando lágrimas sépias de velhas fotografias,...
E tudo parecia ser tão real,...
tão comovente,...
tão miseravelmente humano,...
...e mesmo sendo verdade,...
tudo não passava de uma cena para impressionar...

Mas ela não queria apenas uma testemunha de suas vidas perdidas,...
Queria um cúmplice, uma vítima, um algoz,...
Alguém tão miserável quanto ela,...
Tão perdido quanto ela,...
Tão frágil quanto seus delicados cristais líquidos
expostos em sua face
cruamente derramada no chão,...

Nos abraçamos para não mais nos perder,...
Mas o vácuo com todos seus silêncios ensurdecedores,...
nos assustou,
E as vozes que antes pareciam ter desaparecido pra sempre...
Voltaram com tanta intensidade...
Que o cheio de vazio se tornou insuportável...

E a palavra amor escrita naquele vidro do tempo
caiu diante de nós sem que nada pudéssemos fazer...
Já nem os cacos queríamos juntar,
qualquer gota de sangue derramado poderia ser em vão,
e não nos arriscamos,
apenas deitamos, mudos, lado a lado,
na cama daquele quarto abandonado...
olhamos em silêncio para o buraco negro do teto empoeirado...
e, lentamente, deixamos ser tragados pelo
doce abismo do universo abstrato...


cortaruas, Iquiririm/São Paulo, 11 de agosto de 2007.

Um comentário:

Ana disse...

Puta que pariu, que lindo, que foda!